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33º Domingo do Tempo Comum: Evangelho segundo S. Lucas (21,5-19) - a perseguição dos justos



O EVANGELHO, assim como toda a Liturgia deste domingo (17/11/013), tem um sabor de perseguição à Igreja, que deverá se intensificar no fim dos tempos. Jesus olha o grande Templo e profetiza que vai ruir. Analogamente, não só o grandioso edifício vai desabar, mas também todo este mundo, esta realidade temporal, juntamente com aqueles que nele depositam a sua confiança. Antes, porém, que essas coisas aconteçam, nós, cristãos, seremos perseguidos (Lc 21,12).

Mas o mesmo Deus que profetiza a grande perseguição não seria capaz também de impedi-la? Não poderia evitar tanta tribulação para o seu povo? Por que Deus permite que sua amada Esposa, - a Igreja, - sofra tantas perseguições?

De fato, todo cristão fiel sofre e sofrerá. O Apóstolo S. Paulo chega a dizer que "todos aqueles que quiserem viver piedosamente em Cristo Jesus serão perseguidos" (2Tm 3,12). A perseguição é uma marca da Igreja. A contradição é que exatamente aí nos alegramos, ainda mais, por sermos católicos. Se a Igreja permanecer fiel, será perseguida. Este é um bom sinal!

Uma Igreja aplaudida pelo mundo é uma Igreja espiritualmente doente. Isso não quer dizer que a Igreja precisa ser suicida. - Jesus não foi um suicida. - Mas ela precisa saber aceitar a perseguição como cruz, e aceitá-la com alegria. O Senhor nos advertiu: “Lembrai-vos da palavra que vos disse: não é o servo maior do que seu senhor. Se a mim me perseguiram, também vos perseguirão a vós..." (Jo 15,20).

Esta é uma realidade que deve ser interpretada em chave cristológica, ou seja: estamos configurados a Cristo. Do mesmo modo como Deus Pai não ordenou aos seus anjos que salvassem Jesus do martírio, permitindo que seu próprio Filho padecesse pelo bem da humanidade, também a sua Igreja não será poupada, até que tenha cumprido integralmente a sua missão.


Porque o caminho para Deus é o caminho da Cruz?

A Cruz, na vida do cristão, não é exceção; é regra. Se não houver Cruz em sua vida, talvez seja preciso fazer um exame de consciência.O caminho da Igreja é o mesmo caminho trilhado por Cristo.

“A Igreja só entrará na Glória do Reino por meio desta derradeira Páscoa, em que seguirá seu Senhor em sua Morte e Ressurreição. Portanto, o Reino não se realizará por um triunfo histórico da Igreja segundo um progresso ascendente, mas por uma vitória de Deus sobre o desencadeamento último do mal (...). O triunfo de Deus sobre a revolta do mal assumirá a forma do Juízo Final depois do derradeiro abalo cósmico deste mundo que passa” (CIC §677).

A perseguição, assim como a batalha contra o Dragão que persegue "a Mulher e sua descendência" (Ap 12) é parte integrante tanto da vida da Igreja, como um todo, como também é parte da vida de cada fiel católico, no seu cotidiano.

Por que Deus permite a perseguição? Entre outras coisas, porque é por meio da perseguição que se manifesta a virtude do justo. Se você ama verdadeiramente, se você escolhe o Caminho do verdadeiro Amor cristão, então você será perseguido, e é preciso saber aceitar e conviver com isso.

Existe na Igreja de hoje um certo método pastoral que pode ser considerado, no mínimo, ingênuo. Muitos bispos e padres andam dizendo mais ou menos o seguinte: “Vamos amar mais do que educar, vamos ajudar os pobres, mesmo aqueles que não querem ser ajudados. Vamos lutar pela justiça neste mundo, vamos deixar de pregar o Evangelho e de nos ocupar tanto com a salvação das almas para empenhar nossas forças na 'construção de um mundo melhor'. Assim, um dia, a sociedade verá que somos bonzinhos e deixará de nos perseguir”.

Isso não está funcionando e não vai funcionar. Muita gente anda se esquecendo do que aconteceu quando o próprio Amor se fez carne: o mundo o traiu e assassinou, e o fez porque é essa a lógica intrínseca do amor sem medidas: se amarmos incondicionalmente, seremos sim amados por alguns, mas inevitavelmente seremos perseguidos pelo mundo. O justo será perseguido pelo fato de ser justo. Diz assim o Livro da Sabedoria:

“Cerquemos o justo, porque ele nos incomoda; é contrário às nossas ações; ele nos censura por violar a Lei e nos acusa de contrariar a nossa educação. Ele se gaba de conhecer a Deus, e se chama a si mesmo filho do Senhor! Sua existência é uma censura às nossas ideias; basta a sua vista para nos importunar.” (Sb 2,12-14)

A própria existência do justo é suficiente para incomodar o mundo. Hoje, muitos, dentro da Igreja, dizem: “Vamos ficar quietinhos, vamos ser 'legais', não vamos criar polêmica, e eles vão nos tolerar. Não dificultemos as coisas e eles nos verão como amigos...”. - Infelizmente, isso não existe. Basta a existência do justo para incomodar o mundo. Basta seguir o Evangelho para importunar os servos do Maligno. Toda a Sagrada Escritura, especialmente os Salmos, está repleta dessa realidade, da perseguição aos justos, - e também de sua esperança de salvação por Deus.

“Sereis entregues até por vossos pais, vossos irmãos, vossos parentes e vossos amigos, e matarão muitos de vós. Sereis odiados por todos por causa do meu Nome. Entretanto, não se perderá um só cabelo da vossa cabeça. É pela vossa constância que alcançareis a vossa salvação.” (Lc 21, 15-19)

Diz o seguinte a 1ª Carta do Apóstolo S. Pedro:

“Caríssimos, não vos perturbeis no fogo da provação, como se assim vos acontecesse alguma coisa extraordinária. Pelo contrário, alegrai-vos em ser participantes dos sofrimentos de Cristo, para que vos possais alegrar e exultar no dia em que for manifestada sua Glória. Se fordes ultrajados pelo Nome de Cristo, bem-aventurados sois vós, porque o Espírito de Glória, o Espírito de Deus, repousa sobre vós. Que ninguém de vós sofra como homicida ou ladrão ou difamador ou cobiçador do alheio. Se, porém, padecer como cristão, não se envergonhe; pelo contrário, glorifique a Deus por ter este nome. Porque vem o momento em que se começará o Julgamento pela Casa de Deus.” (I Pd 4, 13-17)

Não vos perturbeis com a provação! Isso não é nada de extraordinário, pelo contrário, é o que se espera! Que alegria sermos perseguidos por amor a Cristo! Isto é um galardão, um troféu, uma honra! Cristo nos amou primeiro, e podermos demonstrar também o nosso amor por Ele é a maior das graças!

E não somos somente nós, cristãos, que sofremos. Continua a Escritura:

“Ora, se Ele começa por nós, qual será a sorte daqueles que são infiéis ao Evangelho de Deus? E, se o justo se salva com dificuldade, que será do ímpio e do pecador? Assim também aqueles que sofrem segundo a vontade de Deus encomendem as suas almas ao Criador Fiel, praticando o bem.” (I Pd 17, 19)

Também os ímpios sofrem, mas a enorme diferença é que eles não têm esperança. E a coroação desta carta do primeiro Papa se dá no capítulo seguinte, quando nos garante: “Confiai-lhe todas as vossas preocupações, porque Ele tem cuidado de vós”. (I Pd 5, 7)

Assim, prezadíssimos irmãos, vejam a resposta que procuramos: por que Deus não faz cessar a perseguição? Porque é por ela que se manifesta a virtude do justo: o Amor. É por meio dela que podemos amar de volta a Quem tanto nos amou. - A ponto de entregar seu único Filho para que vivêssemos eternamente.

O verdadeiro discípulo de Cristo enfrenta a perseguição com uma tranquilidade e uma constância que o identifica como seguidor fiel. "Se alguém quer vir após Mim, negue-se a si mesmo, tome cada dia a sua cruz, e siga-me" (Lc 9,23).


A boa notícia


Carregar a cruz, porém, não quer dizer que tenhamos que viver uma vida só de tristezas, somente de dores, de privações e provações. Ao contrário: significa aceitar tudo o que Deus nos envia, crendo firmemente que é para o nosso bem maior, e aceitá-lo com alegria, sabendo que a verdadeira felicidade é algo infinitamente maior do que ter os nossos caprichos atendidos todos os dias, algo infinitamente maior do que experimentar novas sensações e desfrutar de muitos pequenos prazeres fúteis a cada instante.

E a Cruz não é a última palavra para nós, não é o último estágio. A Páscoa é. Deus virá para nos redimir, para enxugar as nossas lágrimas, para fazer cessar os sofrimentos e as dores. Que alegria saber que suportamos até o fim, que elegemos Deus como o mais importante, como a “prioridade zero” de nossas vidas, e receberemos o prêmio final: a vida eterna. Satanás continuará fazendo de tudo para que cada um de nós se perca. Mas, se permanecermos firmes, ganharemos a Vida infalivelmente. "Quando começarem a acontecer estas coisas, reanimai-vos e levantai as vossas cabeças; porque se aproxima a vossa libertação" (Lc 21,28).

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** Baseado na homilia do 33º Domingo do Tempo Comum de Pe. Paulo Ricardo de Azevedo Jr., disponível em audio em
http://padrepauloricardo.org/episodios/a-perseguicao-dos-justos

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