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Aparições e revelações na Igreja Católica



EPIFANIAS SÃO acontecimentos inexplicáveis e raros. São aparições através das quais a Graça de Deus se manifesta e nos exorta a permanecer no Caminho, que é Cristo, e guardar a Fé. 

Antes de entrar no assunto, porém, achamos conveniente publicar alguns esclarecimentos a respeito de como a Igreja Católica vê as revelações e aparições chamadas particulares.


Revelação Natural e Revelação Sobrenatural

Atesta a Sagrada Escritura que Deus nunca cessou de se interessar, por assim dizer, pelos seres humanos, nem de se manifestar a nós: “Muitas vezes e de muitos modos falou Deus, outrora, aos nossos pais, pelos Profetas; agora, nestes dias, falou-nos por meio do Filho” (Hb 1,1-2)... Deus é Amor (1Jo 4,8) e quer partilhar vida e felicidade com seus filhos e filhas; por isso, se revela de muitas maneiras.

“Revelar” quer dizer “retirar o véu” para dar-se a conhecer. Desde a origem do mundo, Deus dá-se a conhecer por meio das coisas criadas, que, em sua beleza e harmonia, são um testemunho perfeito da Bondade do Criador, como diz São Paulo: “O eterno Poder e Divindade de Deus, desde a criação do mundo, são claramente vistos e percebidos mediante as coisas criadas” (Rm 1, 19-20). Assim, em todo o mundo, mesmo aqueles que nunca ouviram falar em Jesus Cristo podem “reconhecer” Deus, ao menos como Sumo Bem, Princípio e Fim de todas as coisas, através da razão natural (Conc. Vaticano I: DS 3004; DV 6; CIC §36).

Além dessa capacidade que o Criador concedeu naturalmente a todos os homens, de conhecê-lo através de sua Criação, Deus, que "habita em Luz inacessível” (1Tm 6,16), comunica-se aos homens também de maneiras muito especiais e bem mais raras. Para isso, escolheu Abraão, em quem foram abençoadas todas as nações da Terra (Gn 12, 3); depois, tornou Israel o seu povo, revelando-se a este de maneira particular, para que a partir deste povo viesse ao mundo a salvação.

Esta comunicação mais direta de Deus realizou-se plenamente na Encarnação do Verbo, Jesus Cristo: “Cristo, o Filho de Deus feito homem, é a Palavra única, perfeita e insuperável do Pai. Nele o Pai disse tudo, e não haverá outra Palavra senão esta” (CIC §65). Por isso, “já não há que se esperar nenhuma nova revelação pública antes da gloriosa manifestação de Cristo no final dos tempos” (DV 4). Essa Revelação especial está registrada nas Sagradas Escrituras e é garantida pela Assistência do Espírito Santo, que conferiu aos Escritores Sagrados os carismas extraordinários da Revelação e da Inspiração. Dessa maneira é que dizemos que a Bíblia, embora escrita por homens diversos, é “Palavra de Deus”.

Por outro lado, embora a Revelação esteja dada por completo e definitivamente, ela não está totalmente compreendida; cabe à toda a Igreja captar, gradualmente, todo o seu alcance, ao longo dos tempos. É nesse sentido que devemos entender o desenvolvimento dos dogmas na Igreja: não se tratam de novas revelações, mas de um aprofundamento, um desabrochar das verdades já contidas no Depósito da Fé. – Lembrando que o Depósito da Fé é o patrimônio sagrado da fé cristã, contido na Sagrada Escritura e na Sagrada Tradição, confiado aos Apóstolos (Magistério da Igreja) por Jesus Cristo e, por eles, à totalidade da Igreja. A Verdade eterna não muda; a nossa compreensão a respeito desta Verdade, porém, pode e deve aperfeiçoar-se cada vez mais.


Revelações Particulares
No correr dos tempos houve revelações denominadas “particulares”, e algumas delas foram e têm sido reconhecidas pela Autoridade da Igreja. Elas não pertencem, porém, ao Depósito da Fé. A função delas não é “melhorar” ou “completar” a Revelação de Cristo, que é definitiva, mas sim ajudar a vivê-la com mais plenitude, em determinadas épocas da História.

Essas revelações constituem, isto sim, um apelo de Cristo ou de seus santos à Igreja (§CIC 67). É o caso, por exemplo, das aparições de Maria Santíssima em Salete, Fátima, Lourdes ou Guadalupe. Importante notar que o termo “revelação particular” não quer dizer que tais revelações não possam ser conhecidas do povo, ou que digam respeito apenas aos videntes ou a um círculo limitado de pessoas: ao contrário, podem ser fenômenos de repercussão nacional ou mesmo mundial. No entanto, tais revelações são ditas “particulares” porque não fazem parte do Depósito da Fé universal, isto é, católica. Em outras palavras, nenhum católico está obrigado a aceitá-las, mesmo quando já consagradas pela devoção do povo.

Fundamental: “A fé cristã não pode aceitar ‘revelações’ que pretendam ultrapassar ou 'corrigir' a Revelação da qual Cristo é a Perfeição. Este é o caso de certas religiões não-cristãs e também de certas seitas recentes que se fundamentam em tais ‘revelações’” (CIC 67), o que se aplica, por exemplo, aos mórmons e espíritas.



Avaliação das Aparições

Nos últimos tempos, têm-se multiplicado os fenômenos de aparições atribuídas a Nossa Senhora, em diversas partes do mundo (inclusive no Brasil). A respeito de tais fenômenos, existem sempre opiniões favoráveis e opiniões contrárias. O que a Igreja, oficialmente, tem a dizer a respeito?

A Igreja é cautelosa, como deve ser; antes de se pronunciar a respeito de alguma aparição, procede um exame criterioso dos fatos, pois muitas vezes os fiéis, mesmo com toda piedade e boa fé, podem sofrer alucinações, “ver” e “ouvir” projeções mentais. É preciso levar em conta os desvios do psiquismo e a fragilidade humana, sujeita ao engano, aos delírios, etc. Além disso, quem conta um fato facilmente acrescenta ou subtrai algum detalhe que pode ser importante; é assim que um acontecimento estranho ou incomum, porém natural, torna-se “milagre” na boca dos narradores. Leve-se em conta, também, a tendência dos meios de comunicação de provocar as emoções fáceis do público e o sensacionalismo, sem compromisso com a verdade. Por isso são necessários toda prudência e muito cuidado.


Resumo

Aparições e revelações particulares não devem ser admitidas precipitadamente. Os fenômenos devem ser estudados e criteriosamente avaliados pela Igreja antes de dados como comprovados. Enquanto católicos, cremos que, enquanto peregrinos neste mundo, Maria será nossa mãe e educadora na fé (LG 63), sempre a cuidar para que o Evangelho nos penetre intimamente e produza em nós frutos de santidade (Puebla, 290).

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 Adaptado da Carta Pastoral "Orientações sobre Revelações Particulares" (São José dos Campos, 25 de março de 1996), de Dom Nelson Westrupp, SCJ.

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